abro a porta à existência
num lugar longe do meu entendimento
e sinto na pele o ar quente e denso que me envolve
a estranheza da sensação é acompanhada de uma espécie de dissolução das formas que me vestiam...
deixo de me ver
e o que do que me rodeia sinto e percebo... não consigo palavras que o traduzam
fico mudo cada vez que procuro falar
e quando consigo fazê-lo
não consigo dizer nada que faça sentido
atordoado
tento recuar... mas a porta que atravessei não existe mais
e por mais que chame... ninguém me responde
porque não existe seja quem for
nem eu mesmo...
num último esforço da razão
procuro afirmar vontades e convicções distantes
procuro vestir as dores que me faziam alguém num mundo de amores sonhados
felicidades construídas e liberdades adiadas
mas as dores são pequenas para me prender ao seu mundo insano
tento as minhas últimas manifestações de ruído
neste lugar de silêncio em que me encontro
sem qualquer sucesso
voltar atrás já não é possível
por isso deixo-me levar pela corrente da vida
até que a corrente dos silêncios me reclame por inteiro
enquanto não parto...
vou gozando da vida aquilo que ela tem de melhor e de pior para me oferecer
à luz de um qualquer entendimento
já não consigo encontrar em mim o lugar do medo