terça-feira, 22 de julho de 2008

Não sejas feliz amanhã...

(Revisão do que confessei nos Silêncios Meus)

confesso que te amei

teria sido tão fácil a vida
se bastasse dizer o que sentia

mas com o amor veio o céu e o inferno

tentei não ver na vida que partilhei contigo
nem céu nem inferno
tentei fazer da experiência de mim e de ti
num espaço comum sem condições prévias ou futuras
a experiência do amor

mas a existência prega-nos partidas
e a entrega do que em mim era tudo
em ti teve uma expressão que não sei

porque livre de barreiras e condições
percebi o tempo em que teria que me afastar
por estar a mais ou não ser o que afinal querias

porque em ti a vida introduzia premissas que desconhecia
mas que me colocavam longe de ti
aceitei partir

porque aceitar é a base da minha existência
aceitei o fim da proximidade
aceitei a mudança dos registos de comunicação
aceitei a distância que se instalou
aceitei...

descobri o céu no amor
não no que vivi
mas no que até há pouco ainda vivia
no que me fazia explodir interiormente à ideia de ti

descobri o inferno no amor
não no que vivi
mas no que há pouco deixei de viver
quando lutava para amputar o que fazia parte de mim

tentei conviver com o céu e com o inferno
agora...
deixei de tentar viabilizar outras presenças
deixei de tentar que surgissem outros amores
deixei de tentar conviver com a distância
porque não há nada a fazer...

confesso que te amei

não lamento o que vivi
não lamento o que senti
não lamento o céu e o inferno

deixei de fugir

não tento nem tentei voltar atrás
não tento nem tentei (de facto) mais nada

aceitei apenas...

aceitei apenas os lamentos de um sentir que parecia existir nas tuas palavras

aceitei apenas a sensação de que dissesses o que dissesses e fizesses o que fizesses o teu e o meu sentir poderiam ainda ser os mesmos do primeiro dia
em que um fogo de artifício pareceu selar de encomenda o encontro do teu e do meu ser

aceitei o engano no meu entendimento
aceitei que tudo o que disse e sentia era fruto da minha fantasia

agora...
aceito a existência como ela me chega

mas confesso...
já não consigo viver o amor com qualquer tipo de condições
não consigo viver o amor como expressão de qualquer desejo a cumprir no outro
não consigo submeter-me à experiência do amor
que não comece e não acabe nela, em cada momento, num contínuo de presença e afecto

um amor e uma cabana? se tivesse sido esse o caminho, estaria lá
a experiência plena do amor que senti valia todas as fortunas do mundo
e eu dispus-me a vivê-lo contigo
e vivi-o
e por isso fui e sou feliz

o que vai acontecer a seguir?
agora sei
agora tenho a certeza
não desejo nada
aceito em mim a minha disponibilidade para viver
o que a existência me puser no caminho

para lá da razão e de todas as razões
confesso que te amei

e faz-me um favor...
não sejas feliz amanhã...
sê feliz... agora


(e esta poderia ter sido a tua e a minha história)

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