domingo, 26 de outubro de 2008

Outra coisa já não sei ser...

a vida em mim é uma oportunidade que aceito para crescer...
não para me tornar expressão do desejo do mundo

cresci convencido que a vida era o reflexo de regras universais
segundo as quais tudo e todos se moviam

mas muito do que via acontecer em mim e nos outros não parecia obedecer a nada conhecido
com uma imprevisibilidade só explicada pelo princípio de que sendo excepção à regra
validava a regra...

a universalidade dos princípios e as excepções que eram mais que as regras
pareciam legitimar o desejo e a vontade que todos pareciam necessitar ver cumpridos pelos outros
para que a felicidade fosse possível em cada um de nós
transformando a vida numa espécie de jogo de afirmação de direitos e deveres
em que se faz valer o que cada um entende legítimo
sempre na ignorância e apresar da existência desses outros

quando pela primeira vez percebi a artificialidade e fragilidade da rede de que fazia depender a minha vida
tive que dar a mais violenta das gargalhadas...

poderia ter-me sentido zangado pela descoberta do logro
mas não teria a quem apresentar a factura...
por isso fiz a única coisa possível...
observei a minha existência à procura dos muros que existiam na minha vida
e que não estavam lá a fazer nada

percebi que onde sentia dor que em mim despertava zanga
estava uma barreira artificial
fruto da minha vontade
fruto dos meus desejos ou de uma qualquer razão que entendia razoável
fruto dos certos e errados de que me assumira defensor num qualquer momento da minha vida

percebi que esta rede de regras vivia de um tempo que era sempre futuro
em que se projectava o desejo a cumprir
em que se projectavam os anseios, medos e receios antecipados no presente
em que se iam buscar razões para essa ausência do presente
ao que no passado era apontado como experiência a evitar

percebi que por esse caminho
a vida que só conhece um tempo
o presente
me passava ao lado
em que o único crescimento em que me reconhecia
era marcado pela dor e desencanto

e percebi que podia distanciar-me da fúria das razões e vontades
dos desejos e da loucura em que estava a transformar a minha vida

e foi o que fiz...

parei...

onde julgava uma estrada estava o vazio de onde não saía por mais que me mexesse
e onde julgava não existir nada... descobri o mundo
que me escapava porque estava onde não estava
que me escapava porque tentava estar onde gostaria
acabando por estar em lado nenhum...

foi quando o silêncio se instalou em mim
e se definiu como caminho a percorrer...
onde me encontro
e de onde não irei sair...

a vida em mim é uma oportunidade que aceito para crescer...
não para me tornar expressão do desejo do mundo
porque sou liberdade
porque sou amor
porque sou felicidade...
e outra coisa já não sei ser

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