domingo, 31 de janeiro de 2010

Pantomina

dou os mesmos passos de todos os homens
passeio pelos trilhos de todos os outros antes de mim
ensinam-me o sonho como motor de todos os destinos
ensinam-me a fantasia como sabor extremo de todas as sensações
apresentam-me as suas memórias como garantia da justeza das suas certezas
apresentam-me os seus projectos como a inevitabilidade da salvação que não sabia meta
e eu pobre ignorante tomo tudo como certo e percebo-me errado
e eu pobre ignorante escondo-me da vida que não me larga
e eu pobre ignorante fujo da existência que não escolho

aceito um dia a pena a que me julguei condenado
aceito um dia apresentar-me aos que se ameaçavam como meus juizes e carrascos
aceito um dia o fim definitivo a que os meus erros me conduziriam

e o que descubro...
é um silêncio tranquilizador em que se desenha a mais funda e sonora das gargalhadas
como se fosse a um só tempo actor de uma comédia de gosto duvidoso e espectador bem disposto da pantomina que se me oferece

caminho pelos registos da memória de um colectivo que não sabe que não existe como tal
num tempo de que ninguém se dá conta e em que ninguém se consegue encontrar

visto-me com o mais animado sorriso de que sou capaz
e parto a semear ao vento as gargalhadas que os homens esqueceram
mostrando nos caminhos de todos os caminhos que ficaram por trilhar
deitando fora as palavras vazias com que procuram vestir a sua frágil nudez

a eternidade é minha...