sábado, 21 de agosto de 2010

os sentidos das palavras

acordo num lugar escuro e cinzento
envolto por uma neblina feita de fantasmas informes
que quanto mais tento afastar e evitar... mais se fazem em mim presentes e definidos

sento-me no vazio do meu conforto
e deixo de procurar as reacções e respostas certas para as questões erradas que me coloco

o mundo que pressinto vivo à minha volta
aguarda a confirmação das suas certezas nas poucas palavras e gestos a que me entrego...
e eu já me desvinculei de uma horizontalidade que me limita ao cognoscível

o ar torna-se menos denso e mais transparente
e vislumbro em frente uma porta espelhada que reflecte um vulto impreciso que desconheço e que devo ser eu...
caminho no nada em direcção à esperança do encontro com a parte que de mim me escapa
ignoro o reflexo e precipito-me para o espaço que imagino do outro lado...

do outro lado...
acordo num lugar escuro e cinzento
envolto por uma neblina feita de fantasmas informes
que quanto mais tento afastar e evitar... mais se fazem em mim presentes e definidos

repito-me vezes sem conta num ensaio que me traz sempre de volta ao ponto de partida...
a verticalidade escapa-me sempre que a porta é ignorada a favor da esperança que me leva a transpô-la...

desta vez decido ficar quieto no lugar em que me sento
e observo o reflexo que parece ser o único propósito da existência daquela porta que afinal não é porta nem espelho...
sou eu... não pelo que me define como forma e matéria
mas pelos ecos do mundo que em mim ganham corpo e imagino fazerem-me no reflexo que tomo por verdade e por certo

o mundo dilui-se no silêncio que me faz o lugar que palavra nenhuma consegue nos sentidos que encerra