sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Os mantos da tristeza e da dor

olho para os lugares vazios da vida...

a minha vida está cheia de lugares vazios
ofereci-os vezes sem fim ao mundo que me rodeia na esperança que se tornassem cheios
e por mais que os tentasse encher...
permaneceram sempre vazios

o inicial desespero aprendido do vazio que acreditava ter que ser preenchido
cobria os lugares da minha vida com um fino véu de tristeza e melancólica dor...

tornei-me selectivo...
tentei escolher o que entendia serem as presenças ajustadas
refugiei-me em criteriosas razões e regras de todos e de ninguém
e nem os apelos à razão e às fragilidades emocionais bem sucedidas
preenchiam o vazio...

a minha consciência foi ampliando o tamanho e presença desse vazio...

deixei de olhar para esse lugar de tenebrosa aparência
e observei-me...

percebi que fazia o que todos faziam...
percebi que todos os que se sentiam perdidos e vazios
se limitavam a fazer uma grande festa
sempre que se encontravam com outro... igualmente perdido e vazio
aumentando o número dos perdidos e vazios...
acabando todos desencantados e amargurados pelos propósitos não cumpridos pela presença do outro

percebi que me sentia perdido...
sempre que ensaiava o preenchimento dos meus lugares vazios recorrendo ao que me rodeava
tentando fazer da presença e da vida de alguém a matéria de enchimento desse vazio...
tentando encher a minha vida de inúteis objectos e gestos

limitava-me a fazer dos outros prisioneiros e a acumular vaidades...
mesmo quando animado das melhores razões e intenções

deixei de tentar sair desse teimoso vazio...
deixei-me ficar tranquilamente nesse vazio
aguardei sem esperar...

perdi a sensação de estar... perdido
percebi que esse vazio não pode ser preenchido
porque não é da sua natureza tal feito e propósito

olho para os lugares vazios da vida dos que me rodeiam...
e percebo que jamais os irei preencher mesmo que fosse essa a vontade
como não me cabe nem poderei dar as direcções para os lugares do nada de cada um...
apenas os posso acompanhar nesse mergulho que só cada um pode fazer
quando disso for tempo

flutuo num eterno vazio que já não quero preencher... de todo

rasgaram-se definitivamente os mantos da tristeza e melancólica dor com que cobria os lugares da minha vida